sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Vai demorar?


Tem coisa pior que esperar?

Quer dizer, ter tem, mas esperar é uma coisa que me irrita profundamente. Se eu estiver de TPM eu choro. Ou vou embora. De qualquer modo me dá logo dor de cabeça. A gente espera por tudo! Parece que nada acontece na hora certa. Nem quando é com hora marcada. É impressionante.

Quem me conhece mais intimamete sabe que não deve me deixar esperando. Se eu estiver esperando sozinha então, fico insuportavelmente chata. E feia. Fecho a cara, franzo a testa e faço um bico horrosoro (nem percebo, mas sei que é verdade). É verdade que não demora a passar, mas sofro muito enquanto espero. E rogo praga (credo!). Depois eu rezo pedindo perdão, mas vai saber se o mal já não foi feito. Por isso cuidado ao me fazer esperar. Para o meu e o seu bem. Ainda mais agora que, de acordo com alguns, estou "esperando" neném. Dizem que praga de grávida é perigosíssima.

Pois é. Esperando.

Não tinha uma expressãozinha melhor não? Ele já está aqui guardadinho, e eu odeio esperar. O que eu esperei foram quase três anos pra engravidar.

Eu estou grávida. Gestante. Buchuda, se preferir (se bem que ainda não tanto).

Não é uma espera. É uma caminhada. Lenta, onde cada dia é diferente do outro. Ele muda e cresce todo dia e ainda não sabe que eu existo. Eu revezo as dores e mal estares com todo o zelo, faço repouso, uso todas as medicaçoes prescritas, me alimento direito e o que mais precisar. Tudo por querer que ele continue existindo e crescendo dentro de mim.  Estamos juntos. Isso é espera? Não. Minha criança está comigo há sete semaninhas abençoadas.

Quem pega ônibus, pede táxi, vai ao banco, ao médico, à reuniões e visitas comerciais e sociais sabe o que é esperar. Quem nunca ficou horas em um aeroporto esperando uma conexão ou um voo atrasado? Quem já esperou um amigo para um almoço ou cinema até passar a fome ou perder a sessão?

Eu odeio esperar e adoro estar grávida.

Estamos seguindo, nós dois. Alice está nos acompanhando. O Henrique chega já.

Quer vir?










Barriga de gordura (porque com sete semanas ele ainda é pequeno demais para aparecer).
Aguarde as cenas dos próximos capítulos.

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

terça-feira, 26 de junho de 2012

X° Encontro de Música Antiga de Recife/Olinda



De 1º a 10 de agosto de 2012, acontece em Pernambuco o X° Encontro de Música Antiga de Recife/Olinda realizado através do FUNCULTURA/FUNDARPE e com o apoio do Conservatório Pernambucano de Música (CPM).

Na programação estão previstos diversos concertos, master-classes e palestras, além de cursos de instrumentos antigos, dança e canto com os seguintes professores:

Karine Serafin (França) – Canto barroco
Peter de Laurentiis (Itália/França) – Canto barroco
Xavier Julien-Laferriere (França) – Violino barroco
Rosangela de Lima (PE/França) – Flauta doce & flauta transversa barroca
Mário Orlando (RJ) – Danças da renascença & viola da gamba
Raquel Aranha (SP) – Dança barroca & violino barroco
Leonardo Loredo de Sá (RJ/França) – Alaúde
Edmundo Hora (SP) – Cravo & baixo contínuo
Homero de Magalhães Filho (RJ/França) – Conjunto vocais & instrumentais

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Concertos (programação sujeita a modificações) :

1° de agosto (quarta-feira): Conjunto dos Professores do X° Encontro
2 de agosto (quinta-feira): Sonoro Ofício (orquestra de câmara da UFPE) e Ensemble Vocal Gárgula (PE) – direção: Sérgio Dias
3 de agosto (sexta-feira) Quintaessentia – quarteto de flautas doces (SP)
4 de agosto (sábado) Orquestra Sinfônica Jovem do CPM (PE) - direção: José Renato Accioly
5 de agosto (domingo) Ensemble Musica Nova (França) – direção: Lucien Kandel
6 de agosto (segunda-feira) Duo Lotus - I. d’Avena (flauta doce) e C. Ribeiro (cravo) – (RJ/SP/Holanda)
7 de agosto (terça-feira): Conjunto Músicos de Capella (SP) - direção: Luís Otávio Santos
8 de agosto (quarta-feira): Conjunto Allegretto (PE)
9 de agosto (quinta-feira): Audição de alunos do X° Encontro
10 de agosto (sexta-feira): Concerto de Encerramento do X° Encontro (professores e alunos)

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Master-classes / Palestras (sempre pela manhã)

4 de agosto (sábado): O método Suzuki aplicado à flauta doce (Renata Pereira, flautista do conjunto Quintaessentia)
6 de agosto (segunda-feira): Canto medieval e renascentista (Lucien Kandel, Carolina Magalhães e membros do conjunto Musica Nova – França)
8 de agosto (quarta-feira): Violino barroco (Luis Otávio Santos e membros do conjunto Músicos de Capella)

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Produção Executiva: Roseane Hazin
Coordenação: Viviane Guedes Pimentel
Direção artística: Homero de Magalhães Filho

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http://www.facebook.com/events/245914592165183/

segunda-feira, 11 de junho de 2012






A Triste Partida

Luíz Gonzaga


Compositor: Patativa do Assaré

Tom: D

Tom-D




                  Google Images


D

Meu Deus, meu Deus. . .

Bm

Setembro passou

Em

Outubro e Novembro

A7

Já tamo em Dezembro

D

Meu Deus, que é de nós,



Meu Deus, meu Deus

D7 G

Assim fala o pobre

D

Do seco Nordeste

Gm D

Com medo da peste,

A7 D

Da fome feroz

Em A7 G D

Ai, ai, ai, ai



Bm

A treze do mês

Em

Ele fez experiência

A

Perdeu sua crença

A7 D

Nas pedras de sal,



Meu Deus, meu Deus

D7 G

Mas noutra esperança

D

Com gosto se agarra

Gm D

Pensando na barra

A7 D

Do alegre Natal

Em A7 G D

Ai, ai, ai, ai

Bm

Rompeu-se o Natal

Em

Porém barra não veio

A7

O sol bem vermeio

D

Nasceu muito além



Meu Deus, meu Deus

D7 G

Na copa da mata

D

Buzina a cigarra

Gm D

Ninguém vê a barra

A7 D

Pois a barra não tem

Em A7 G D

Ai, ai, ai, ai

Bm

Sem chuva na terra

Em

Descamba Janeiro,

A7

Depois fevereiro

D

E o mesmo verão



Meu Deus, meu Deus

D7 G

Entonce o nortista

D

Pensando consigo

Gm D

Diz: "isso é castigo

A7 D

não chove mais não"

Em A7 G D

Ai, ai, ai, ai

Bm

Apela pra Março

Em

Que é o mês preferido

A7

Do santo querido

G D

Senhor São José



Meu Deus, meu Deus

D7 G

Mas nada de chuva

D

Tá tudo sem jeito

Gm D

Lhe foge do peito

A7 D

O resto da fé

Em A7 G D

Ai, ai, ai, ai

Bm

Agora pensando

Em

Ele segue outra tria

A7

Chamando a famia

D

Começa a dizer



Meu Deus, meu Deus

D7 G

Eu vendo meu burro

D

Meu jegue e o cavalo

Gm D

Nós vamos a São Paulo

A7 D

Viver ou morrer

Em A7 G D

Ai, ai, ai, ai

Bm

Nós vamos a São Paulo

Em

Que a coisa tá feia

A7

Por terras alheia

D

Nós vamos vagar



Meu Deus, meu Deus

D7 G

Se o nosso destino

D

Não for tão mesquinho

Gm D

Cá pro mesmo cantinho

A7 D

Nós torna a voltar

Em A7 G D

Ai, ai, ai, ai

Bm

E vende seu burro

Em

Jumento e o cavalo

A7

Inté mesmo o galo

D

Venderam também



Meu Deus, meu Deus

D7 G

Pois logo aparece

D

Feliz fazendeiro

Gm D

Por pouco dinheiro

A7 D

Lhe compra o que tem

Em A7 G D

Ai, ai, ai, ai

Bm

Em um caminhão

Em

Ele joga a famia

A

Chegou o triste dia

A7 D

Já vai viajar



Meu Deus, meu Deus

D7 G

A seca terrível

D

Que tudo devora

Gm D

Lhe bota pra fora

A7 D

Da terra natá

Em A7 G D

Ai, ai, ai, ai

Bm
O carro já corre

Em

No topo da serra

A

Oiando pra terra

A7 D

Seu berço, seu lar



Meu Deus, meu Deus

D7 G

Aquele nortista

D

Partido de pena



Alguns links que levam à informações sobre o Rei do Baião:

http://www.reidobaiao.com.br/

http://dicasgratisnanet.blogspot.com.br/2012/05/biografia-de-luiz-gonzaga-resumo.html

http://pt.wikipedia.org/wiki/Luiz_Gonzaga

http://educacao.uol.com.br/biografias/luiz-gonzaga.jhtm

http://www.raimundofagner.com.br/perfil_LuizGonzaga.htm




sábado, 12 de maio de 2012

DissolVida


Estiquei o passo para não pisar na poça cor de rosa. Foi por um tris. Parei para olhar meus pés e levantei um pouco a barra do vestido. O salto do meu lindo sapato roxo, revestido de camurça e veludo, ficaria destruído. Molhado, melado, impregnado daquele líquido viscoso. Um fio brilhante havia surgido da borda superior da poça e, com medo, fui seguindo sua extensão até chegar à barra do vestido. Com o movimento, o tecido úmido tocou a pele acima do meu tornozelo.

Raiva e nojo. Meu vestido, minha perna. Nem quis saber do meu sapato preservado. Que se danasse a Polliana e seu jogo do contente. Era ir segurando a saia até chegar ao curso e lavá-la no banheiro ou deixa-la arrastar no chão até que a sujeira e a terra do meu caminho se incorporassem ao líquido, formando uma massa endurecida e pegajosa, que tanto poderia ressecar e esfarelar durante toda a caminhada quanto formar uma lama nojenta que ficaria tocando minha perna – e meu sapato caro - enquanto eu continuasse a caminhada até o Espaço Cultural.

Voltei meus olhos ao objeto de minha ira. O lago rosado com manchas furta-cor. Uma bela forma ovalada, estragada pela barra do meu vestido. O palito estava lá, perpendicular ao risco formado pela junção do piso desbotado. Pelo ponto de vista da poça a tirana era eu. A gigante destruidora de margens. Afinal ela estava lá primeiro. Que culpa ela teria de a gigante não olhar por onde anda? Qualquer criança sabe que não se deve andar olhando para o nada, com a cabeça lá longe.

Criança. Antes de virar poça aquele líquido poderia estar refrescando alguma criança. Tão desatenta quanto a gigante. Palito sem identificação de marca. Picolé barato. Criança pobre. A mãe só tinha as moedas para aquele. E a criança na ânsia de sorvê-lo deve tê-lo derrubado após a primeira lambida – a poça era grande. Ou mora na rua e ganhou as moedas de algum motorista no semáforo e escapou do patrão que fica sentado em baixo da árvore, esperando o pagamento do aluguel do ponto: deu umas duas mordidas rápidas e jogou a maior parte, com medo de ser pego roubando. E ali, caído, sangrando até a morte, seus restos belos e pegajosos, sujando os passantes, nem um cachorro sarnento para lamber seus fluidos.

Fazia pouco tempo que havia tombado. Ainda brilhava. O calor do sol ainda não havia transformado seu líquido rosado numa mancha escura e cheia de dejetos. Dali a algum tempo seria pisado e espalhado. Várias pegadas ficariam ao redor do que antes era a poça. Ninguém mais saberia da perda daquela criança. Da criança pobre. Da pobre criança explorada. Que não tem nada e ainda perde o doce.
 
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O último do "Escrever Pra que
Dezembro de 2011

terça-feira, 24 de abril de 2012

Concursos Culturais sobre Drogas




A Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas – SENAD com o objetivo de incentivar a participação dos diferentes níveis estudantis em atividades culturais de valorização da vida e estimular a mobilização e o engajamento da sociedade nas atividades relacionadas à prevenção do uso de drogas está promovendo o XIII Concurso Nacional de Cartazes, direcionado a estudantes de 2º ao 5º anos do Ensino Fundamental; o II Concurso de Vídeo, para estudantes do 6º ao 9º anos do Ensino Médio; o X Concurso Nacional de Fotografia, o X Concurso Nacional de Jingle dirigido à população em geral e o XI Concurso Nacional de Monografia, voltado para estudantes universitários, com prêmios de até R$ 6 mil.

Os trabalhos podem ser enviados até 27 de abril. A finalidade dos concursos, realizados anualmente, é incentivar a reflexão e a discussão sobre a questão das drogas nos ambientes escolar e universitário, e no dia a dia do cidadão brasileiro.

Cartazes: podem participar estudantes do 2º ao 5º anos do Ensino Fundamental, de escolas públicas ou privadas de todo o país. São quatro categorias (2° ano, 3° ano, 4° ano e 5° ano). Serão premiados com até R$ 2 mil, três cartazes por região (Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sul e Sudeste) em cada categoria.


Fotografia: aberto a profissionais e amadores, que disputam um único prêmio de R$ 3 mil por região.










 


Jingle: voltado a músicos profissionais ou amadores e premiará com o valor de R$ 3 mil o melhor trabalho de cada região.


 







Vídeo: alunos do 6° ao 9º ano do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, de escolas públicas ou privadas de todo o país, divididos em duas categorias (6° ao 9° ano do ensino fundamental e 1° ao 3° ano do ensino médio). O concurso premiará com o valor de R$ 3 mil um vídeo de cada região, por categoria.








Monografia: podem participar estudantes universitários matriculados em cursos de graduação das instituições de ensino superior reconhecidas pelo Ministério da Educação. Serão premiados com até R$ 6 mil os três melhores trabalhos em nível nacional.







Os trabalhos, as fichas de inscrição preenchidas com as respectivas declarações de matricula deverão ser enviados até a próxima sexta-feira (27) para: Senad – Ministério da Justiça – Esplanada dos Ministérios, Bloco T, Anexo II, Sala 205, CEP 70.064-900, Brasília/DF. Maiores informações poderão ser obtidos pelo e-mail concursos.senad@mj.gov.br ou portal www.obid.senad.gov.br

Fonte: Ministério da Justiça

domingo, 8 de abril de 2012

Maravilhas de Alice

“Não criança, você não pode recortar esta fotografia de festa”. Meu álbum de casamento estava aberto sobre o bonito tapete de flores de lã, feito com muito carinho pela minha mãe quando Alice ainda era um bebê. Ao seu lado o caderno de desenho, diversas revistas e uma menininha de óculos cor-de-rosa, com uma tesoura na mão, observando com atenção alguma coisa na página: “Mamãe, eu queria comer um docinho desses aqui! Que pena que eu não estava lá! Bem que poderia existir uma passagem para o mundo da imaginação... ”.

Quanta criatividade! A liberdade do processo mental infantil é mesmo uma maravilha. O lúdico, a sinceridade e a simplicidade com que transformam a realidade é um mistério para a maioria da população dita adulta. Alice tem uma energia imensa. Por vezes esqueço que só tem cinco anos, principalmente quando me lança seu olhar petulante e ousado.

Tudo nela é intenso e, por diversas vezes, deixa seu interlocutor obnubilado. Nasceu em 30 de outubro e em novembro já pergunta sobre o próximo aniversário. Com ela não tenho nenhum tipo de saudosismo: vivo sua infância como se fosse a minha.

Sempre que estou com ela sinto uma emoção indescritível. Uma forte alegria, cheia de amor e respeito por aquela pessoinha tão especial. Quanto chego em casa ela grita e corre para me receber com um abraço. Pula e se larga, numa atitude de confiança extrema, sabendo que não vai cair ou se machucar.

E todos os dias ela tem alguma novidade: o jogo da socialização do recreio, o sexo da tartaruga, a nova música da aula de dança, o destino da nossa próxima viagem de férias. Outro dia ela fez a maior mobilização na escola por causa da Luiza, que é evangélica e não podia pular Carnaval com os outros coleguinhas.

Por causa dela sei que não estou neste mundo a turismo. Ela veio me ensinar o despego ao que não tem valor real, o olhar holístico do mundo, a importância da fraternidade e da harmonia no lar, a reprovação da rotina e do comodismo. Nada é consuetudinário. Não existe nenhum paradigma que não quebre por ela.

Ofereci uma cocada ao invés dos docinhos finos do casamento, já sabendo que ela não iria comer. Olhamos juntas as revistas e terminamos de recortar as figuras festivas. Ela quis me propor que eu escrevesse todas as legendas, mas contornei a situação: “Assim que você escrever tudinho, com letra cursiva, faremos um cineminha aqui no quarto e você escolhe o DVD”. Ela abriu um sorriso de derreter iceberg e gritou: “Oba! Veremos Barbie Moda e Magia”.

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Trabalho da Ufal. Cada aluno deveria produzir um texto de até 30 linhas utilizando 50 palavras escolhidas pela turma.

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Fórceps

Mais um das criações para o "Escrever pra que?".
Em setembro do ano passado, visitamos a mostra "Incetisismo", lá mesmo no  Sesc Centro. Era uma exposição individual do artista visual alagoano Allan Monteiro, que reunia esculturas feitas em ferro, resina, massa plástica e outros materiais. 
Na entrada havia um cartaz que fotografei. Não li nada sobre o artista e o estilo. Não fotografei as peças para que escrevesse apenas o que senti na hora. Sem rever e reavaliar.


Fórceps

Eu olhava e só via desespero. Não: angústia, medo, dor, solidão, terror, espanto, loucura. Desesperadamente intensos em fluidez contínua. Mesmo os intervalos não pareciam pausas, pois no espaço aparentemente vazio o grito, mudo, ecoava.

Parei, olhei e falei. Dos olhos à boca sem filtro: “- O desespero era tanto que explodiu a cabeça para poder sair!”. Envergonhada ante os olhares de estranheza dos colegas, me desculpei e prossegui, calada, mas torcendo pra alguém me perguntar alguma coisa, pois minha língua estava doida para fugir da boca e colocar pra fora pelo menos a metade das coisas que povoavam a minha cabeça. Antes pela boca que pelo topo do crânio.

Era um tipo de latrina. Ou um calabouço. Um híbrido de privada e masmorra. Um espaço onde ele expeliu, de uma forma ou de outra, uma tormenta avassaladora. Seus monstros deviam ser grandes e terríveis. E ele deu descarga. Alguns eram invisíveis e saíram pela boca, ou abriram caminho à força, explodindo uma cabeça torturada de diversas maneiras, por várias vezes. Havia ainda os que foram paridos em agonia, ou aguardavam a sua vez, ondulando em pêndulos de crisálidas improváveis.

Ele deve ser existencialista. Não quero pensar que seja alguém consumido pela depressão. De qualquer forma, percebi sua angústia de sentir um conteúdo crescente num continente limitador. A impotência de sua condição humana à mercê de um mundo castrador e de uma imaginação desenfreada. Quais teriam sido suas escolhas para que chegasse até ali? O que ele teria feito com a sua liberdade para que sua existência fosse de conflito e fuga? Que experiências e relacionamentos colecionou em sua existência que justificassem tudo aquilo?

Não consegui dar uma face ao criador analisando suas criaturas. Pior, não consegui captar a beleza que existe em toda obra de arte. O grotesco e o horror, para mim tem de beleza apenas a ausência. Também não fiz grandes aquisições intelectuais. Encontrei ali uma representação plástica do desespero.  Talvez fosse a terapia do artista. De saldo, a alegria, o alívio e a certeza de não me reconhecer em nada, e a esperança de não termos nada em comum.

sábado, 28 de janeiro de 2012

Anacrônica



Lá ele parece não ter passado. Parece que a qualquer momento, numa esquina ou curva de suas ruas de pedras gastas, surgirá uma “sinhá” de vestido longo e sombrinha de babados.

De longe avistei o casarão amarelo, avarandado e imponente. Com seus jardins escuros e cheios de musgo. A escadaria lateral coberta de poeira e folhas. Encostei a mão no portão e nela pousei meu rosto. Achei ter ouvido uma sonata de Mozart ao piano. Uma vereda quase desaparecida ainda serpenteava em direção aos fundos do casarão. Um porche novinho na garagem ao lado do caramanchão me expulsou de volta ao século 21.

Acordei cedinho porque o cicerone do meu grupo, ao ver minha câmera fotográfica reflex novinha, havia me alertado, na noite anterior, sobre alguns adolescentes que, de uns tempor pra cá, começaram a assaltar pessoas sozinhas andando pelas ruas desertas. Assaltavam os incautos turistas que, de olhos e boca abertos pela beleza da cidade, se descuidavam e vagavam pelas ruas estreitas e desertas, acompanhados apenas dos fantasmas que parecem magnetizar os sentidos, fazendo a percepção de espaço-tempo parecer deslocada.

O ar friozinho e a luz suave deixavam tudo mais vivo e limpo. O orvalho ainda escorria nas folhas e as janelas estavam suadas. Os cliques quebrando o silêncio do dia recém-nascido soavam como um sacrilégio. Mas apesar de a máquina não capturar também meu estado de espírito, eu não me permiti perder o pouco que me restaria daquela experiência e tratei de espantar o estado de reverência, pegando pros meus arquivos fotográficos um pouquinho daquilo tudo.

Um ônibus velho, chacoalhando feia e barulhentamente passou ao lado do colégio estadual. Senti a repulsa das pedras do calçamento subir pelas minhas pernas. Até as paredes estremeceram de indignação. Numa curva fechada quase tive esperança de que ele tombasse, ferido de morte. Mas ele tossiu sua fumaça escura e malcheirosa e subiu a ladeira, se contorcendo e gemendo como um verme agonizante, deixando um rastro escuro que eu jurei cheirar a enxofre. Aos poucos a atmosfera se regenerou e pude ouvir de novo o chamado de sereia dos espíritos dos casarões e casebres. Das praças, das árvores e calçadas. Foi por um triz.

Eu a vi de longe e caminhei lentamente até ela e entrei. O cheiro de passado me envolveu. Sentei no último banco. Toquei na madeira do espaldar. Fria e lisa. Quantos e há quanto tempo ali estiveram, agradecendo ou pedindo? Quantas mãos descansaram naquele mesmo lugar, para dar aquela textura ao rústico último banco da bela pequena igreja dos pretos? Não consegui levantar a câmera lá dentro. Na verdade, nem me lembrei que carregava uma. Atravessei a curta nave acariciando cada um dos bancos enquanto ouvia o barulho dos meus passos no piso poroso. O cheiro, a textura e o som me acompanharam até o altar.

Ao me virar para sair, através da luz que entrava pela porta lateral, uma sombra escorregava entre o primeiro banco e a entrada da sacristia. Os olhos, acostumados à penumbra demoraram a distinguir a pequena senhora que, de joelhos, rezava. Senti-me a intrusa-mor e saí dali “fugida”. Eu não tinha rezado um Pai-Nosso sequer. Ao cruzar a porta e sentir a luz e o calor do sol no rosto, percebi que havia feito uma de minhas melhores orações.

Voltei caminhando para a pousada. O dono assistia ao telejornal sentado numa poltrona antiga enquanto seu filho digitava num smartphone. Tropecei, mas se tivesse caído não sentiria tanto. Me deu até vontade de chorar. Espantei as lágrimas, mas a visão continuou turva.

E ele, que parecia não ter passado, riu da minha cara, enquanto eu subia os degraus irregulares da brega escada de azulejos coloridos. Ele e o relógio digital que me olhavam através do espelho manchado colocado como enfeite sobre uma mesa de toalha plástica com desenhos de frutas. "Corre Adriana. Eu já estou aqui e você está atrasada".

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Foto: Jalon Nunes


Outro exercício do "Escrever pra que?" - Crônica sobre a cidade de Penedo

domingo, 1 de janeiro de 2012

O avesso





Escuro de cinema

Sessão da tarde

Língua pelada

Sede

Fio dental



Final de semana

Estalos cheirosos

Fome de madrugada

Sofá

Colar de carnaval



Parque de Diversões

Criança na praça

Saída de missa

Amor

Avô

...

Ele riscou, cortou e alinhavou

Ela costurou, passou com vincos e vestiu

Ele colocou o milho na panela, tampou e riscou o palito

Ela girou o botão e acendeu o fogo: calor e luz

Então ela se olhou; e resolveu virar do avesso.
 
 
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Outro do "Escrever pra que?

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